Série de nove crônicas publicadas
originalmente no jornal
Tribuna de Minas de maio a setembro de 2000,
por ocasião das comemorações dos 150
anos de Juiz de Fora.
CAPA DO LIVRO DE FOTOGRAFIAS JF ANOS 80, DE HUMBERTO NICOLINE |
A cidade atrás das manchetes
Fernando Fiorese
Houve
tempo em que, por detrás do majestoso epíteto de “Manchester Mineira”, se
escondia o horror do trabalho nas fábricas de Juiz de Fora. Às lutas operárias
devemos o aprimoramento, ainda que precário e imperfeito, das relações entre
capital e trabalho, mas uma inteira cidade permanece oculta por detrás das
manchetes dos jornais e dos noticiários televisivos. Uma Juiz de Fora invisível
à imprensa local.
Um
amigo nascido e criado no bairro da Creosotagem (e haverá ainda memória sobre o
tempo e o lugar que este nome evoca?) dizia-me certa feita que a incipiente relação
entre a imprensa e a cidade podia ser dimensionada pela profusão de cartazes
nos tapumes e de filipetas distribuídas no Calçadão da Halfeld. Está em jogo
aqui a própria função social do jornalismo, os seus princípios básicos como
instrumento de reflexão (no sentido intelectual e ótico) sobre e da comunidade.
Neste
sentido, cumpre a todos nós, jornalistas, leitores e telespectadores, definirmos
estratégias de restabelecimento da consanguinidade entre Juiz de Fora e a
imprensa local, reaprendendo a lição do velho jornalista francês: “Um incêndio
no Quartier Latin interessa mais do que uma Revolução em Cuba”. Não, meu caro
leitor, não se trata de propugnar por uma imprensa provinciana, tacanha,
interessada tão-somente no pitoresco e no folclórico. O que se pretende é uma
imprensa capaz de desvelar a polifonia de uma cidade de 500 mil habitantes, de
registrar as suas misérias e as suas grandezas, de escavar os tempos e lugares
ocultos sob a pátina dos discursos oficiais e oficiosos.
Houve
épocas em que a imprensa local era menos afeita aos press-releases e entrevistas coletivas. A tarefa diária dos
jornalistas se confundia com o perder-se
na cidade para fazer de seus textos, vozes e imagens o fio de Ariadne com que os
leitores podiam penetrar nos enigmas da Juiz de Fora concreta e cotidiana. E se
o ritmo das redações dificultava esta tarefa, havia os cronistas locais,
empenhados em inscrever no livro de registros da cidade os acontecimentos
efêmeros, as personagens anônimas, os dramas mínimos, as paisagens
transitórias.
Onde os jornalistas capazes de descentralizar o
noticiário para atingir as margens? Onde os cronistas que humanizam os espaços
da cidade, doando sentidos, personagens e movimentos à nossa cena cotidiana?
Onde os jornais impressos, radiofônicos e televisivos em que Juiz de Fora seja protagonista, e não mera
figurante ou estilizado cenário? Restabelecer a relação especular dos meios de
comunicação com a cidade é tarefa de todos nós, pois não podemos descurar do
papel fulcral da imprensa na construção da imagem e da identidade cultural de
Juiz de Fora. Sem espelhos que reflitam a cidade, sua história, seus centros,
suas margens, torna-se impossível perceber que a proposição do Plano Estratégico
da Prefeitura Municipal de uma cidade-educadora é apenas a reiteração do que já
fomos e, apesar das políticas públicas, continuamos sendo. Esta uma de nossas
muitas faces ocultas, construída por gerações de anônimos professores, embora
precariamente figure nos noticiários.
Caramba professor... arrasou hein??
ResponderExcluirÉ essa sua visão de Juiz de Fora da época??
Eu cheguei a imaginá-la totalmente em minha mente... uma vez que, suas palavras me transportaram à essa Juiz de Fora descrita por suas belas e inconfundíveis palavras!!!